A Zona Sul de São Paulo, conhecida por sua diversidade e amplitude, está vivenciando uma transformação significativa na forma como os espaços públicos são ocupados, especialmente com a crescente presença de marcas comerciais. A sanção da lei pelo prefeito Ricardo Nunes, que permite a venda de naming rights para escolas, unidades de saúde e outros locais públicos, está reconfigurando a paisagem urbana dessa região da cidade. O que antes era um cenário mais voltado à convivência comunitária e à prática de lazer, agora começa a incorporar o nome de grandes corporações, mudando a identidade desses espaços de maneira visível e impactante.
A venda de naming rights, ou direito de nomeação, é uma estratégia que vem ganhando força em várias partes de São Paulo, e a Zona Sul não é exceção. Com a escassez de recursos públicos, o poder público encontra nessa prática uma maneira de financiar a infraestrutura local. Em áreas como escolas e unidades de saúde, a parceria com marcas privadas tem o potencial de melhorar os serviços prestados à população. Embora essa solução possa representar uma inovação econômica, ela também gera um debate sobre o limite entre a necessidade de recursos e a mercantilização do que deveria ser um bem comum.
Na Zona Sul, onde bairros como Vila Progredior, Capão Redondo e Santo Amaro estão em pleno desenvolvimento, a presença de marcas em parques e unidades públicas vai além do simples apoio financeiro. Agora, muitos desses espaços têm seus nomes associados a empresas, o que altera a percepção das pessoas sobre esses locais. Um parque que antes representava um espaço de lazer e descontração agora leva o nome de uma grande marca, modificando sua identidade e a maneira como os cidadãos interagem com ele. Esse movimento está se espalhando por diversos bairros da região, trazendo uma nova dinâmica à relação entre os cidadãos e os espaços que frequentam.
O impacto dessa mudança é sentido diretamente pelos moradores da Zona Sul, que se veem cada vez mais imersos em um ambiente onde o comércio e a publicidade se tornam parte integrante da vida cotidiana. Com o nome de marcas em escolas, unidades de saúde e até estações de metrô, a sensação de pertencimento e de um espaço livre de influências externas começa a ser diluída. A tradicional ideia de que os espaços públicos devem ser acessíveis a todos, sem qualquer interferência comercial, começa a ser questionada, dando lugar a um novo modelo de cidade, onde as empresas têm voz e presença em locais fundamentais para a vida dos cidadãos.
Embora a venda de naming rights possa ajudar a financiar melhorias nos parques e outras áreas públicas da Zona Sul, como a revitalização de praças e a criação de novos centros culturais, o efeito sobre a experiência do cidadão não pode ser ignorado. Moradores de bairros como Grajaú e Jardim Ângela, que já enfrentam desafios em relação ao acesso a serviços públicos de qualidade, agora precisam se adaptar a uma realidade onde a presença de marcas comerciais interfere na identidade desses espaços. As pessoas começam a questionar se essas mudanças são realmente benéficas para o coletivo ou se o preço disso é um deslocamento da verdadeira função pública dos espaços.
Além disso, a introdução de marcas em locais como o metrô e as estações de trem da Zona Sul gera um novo desafio para a mobilidade urbana. A tradicional nomenclatura de estações, que muitas vezes estava associada a nomes históricos ou geográficos, agora se mistura com o branding corporativo, o que pode confundir o usuário comum. Esse fenômeno, que já ocorre em outros locais do mundo, toma uma proporção particular em São Paulo, onde a população já lida com a complexidade do sistema de transporte público. Moradores da Zona Sul, como aqueles que dependem da Linha 5-Lilás do metrô, podem se sentir distantes da sua própria cidade ao se depararem com nomes de marcas dominando o cotidiano urbano.
Por outro lado, muitos veem essa mudança como uma oportunidade de crescimento e inovação para a cidade. Empresas privadas podem trazer novos investimentos para áreas que historicamente enfrentaram carências em infraestrutura. A visibilidade das marcas pode gerar mais fluxo de turistas e também atrair mais investimentos para bairros da Zona Sul, como Cidade Ademar e Jabaquara, que têm se tornado importantes polos econômicos. A ideia é que a presença dessas marcas possa estimular a criação de novos empregos e a implementação de serviços essenciais, criando uma cidade mais conectada com as necessidades do mercado.
Porém, a transformação da Zona Sul em um campo de ação publicitária, onde marcas assumem o controle de locais públicos, também traz preocupações sobre a descaracterização desses espaços. A venda de naming rights pode ser uma solução prática para o financiamento de algumas obras e melhorias, mas há um custo intangível que deve ser considerado. A identidade de bairros com forte tradição cultural e comunitária pode ser afetada por essa apropriação corporativa. A Zona Sul, com suas ruas vibrantes e comunidades diversas, pode se tornar um grande shopping a céu aberto, onde as relações sociais e culturais são substituídas por campanhas publicitárias.
A questão que fica para os paulistanos da Zona Sul, e para a cidade como um todo, é se esse modelo de cidade das marcas é sustentável a longo prazo. Será que a presença de tantas corporações nos espaços públicos vai garantir a manutenção da qualidade de vida e da convivência comunitária? Ou será que, ao ceder cada vez mais o nome de locais públicos para as empresas, São Paulo está sacrificando a sua essência em nome do progresso econômico? A reflexão sobre os limites do marketing nos espaços públicos é crucial para o futuro da cidade, que, na busca por mais recursos, pode estar perdendo um pouco de sua identidade original.
Autor: Mikhail Ivanov